Pular para o conteúdo principal

Violência na Baixada debatida na academia


Articulador do FGB participou de mesa sobre extermínio da juventude negra na UFRJ


Em meio a mais uma crise de segurança pública que se abateu no Estado, a Universidade Federal do Rio de Janeiro dava prosseguimento a segunda aula do IV Curso de Extensão, Mídia e Violência, com um tema bem delicado: o extermínio da juventude negra, principalmente em comunidades pobres e periféricas e como essas práticas eram corroboradas pelo jornalismo hegemônico. O articulador do Fórum Grita Baixada, Douglas Almeida, foi um dos debatedores e contou como essa trajetória se revela nos territórios da região. “A Baixada sempre foi conhecida como um território hostil, pelo número de homicídios, mas essa preocupação nunca foi demonstrada pelo poder público que sempre monitorou os roubos, furtos e outros danos causados ao patrimônio, mas nunca às vidas humanas da região”, disse Almeida.

A “Guerra do Rio”, que há duas semanas foi declarada não-oficialmente por um meio de comunicação das Organizações Globo, que se valeu, inclusive, de criar uma “editoria” específica para esse tipo de cobertura foi amplamente discutida pelos debatedores. Almeida fez uma comparação sobre o mesmo histórico acontecido na Baixada, mas sem deixar de mencionar o desequilíbrio de repercussão executado pela mídia. “As práticas de extermínio sempre existiram e se tornaram piores a partir das décadas de 1980, 1990 e nos anos 2000, mas a cobertura da mídia nessas situações sempre foi pontual e pouco desenvolvida, isso sem considerar inúmeras chacinas na Baixada que nunca foram noticiadas”.  

Em seguida, Almeida fez uma breve apresentação sobre a atuação do Fórum Grita Baixada, embora reconheça que haja algumas resistências sobre o entendimento de trabalho como o desenvolvido pelo FGB. “Não deixamos de fazer um trabalho de incidência política nos governos municipais, mas buscamos ramificar e ampliar a discussão nos territórios onde atuamos. Pra mobilizar, encontramos formas de dialogar diretamente com os moradores das áreas periféricas. Impressiona como muitas delas, estão contaminadas pela ideologia do “bandido bom é bandido morto”. Utilizam jargões policiais sobre o delinquente, como “vagabundo”. É uma forma de se identificar com muitas simbologias discursivas”, explicou.

Marcelle Decothé, articuladora política da Anistia Internacional, após fazer uma análise sobre a Campanha Jovem Negro Vivo a pedido de uma ouvinte, também comentou a declaração de guerra institucionalizada pelo jornal. “Os dados sobre os assassinatos da população negra e pobre estão aí a disposição dos governos, mas quase não se fala sobre isso na mídia hegemônica. Isso deveria ser falado cotidianamente, já que ano após ano várias instituições se dispõem a fazer essa investigação.”, argumentou Marcelle. Ela disse, também, que é necessário racializar o debate sobre segurança pública, já que a mídia sempre coloca a criminalidade e a pobreza como fatores primordiais, mas esquece que discutir o quanto o racismo está inserido nesse contexto.  

A questão do racismo como fomentar de determinadas violências, também foi pautado pelo jornalista Diego Santos, morador do Morro do Boréu. “Tudo para o povo preto e pobre é insignificante. Pois quando falamos sobre Rafael Braga a comoção é pouca, mas quando um médico branco é esfaqueado na Lagoa Rodrigo de Freitas, é um estardalhaço feito pela mídia. Toda a conjuntura de uma sociedade é precarizada quando é desenhada para o preto e pobre: escola, hospital, moradia, profissões. A proteção do Estado, que tanto é propalada na constituição é apenas para os não negros”, disse Diego.     

Aline Santanna, jornalista e professora do CEDERJ, que ficou responsável pela mediação da mesa disse que o público presente na aula era bem diverso. “Não estamos falando com os iguais, a universidade é um espaço que carece de pessoas que não tem voz. O extermínio é uma palavra que é cara para mesas como essa”. Finalizou Aline.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Estado Brasileiro é julgado por seus crimes

Fórum Grita Baixada e movimentos sociais organizam o Tribunal Popular da Baixada Fluminense, na Praça do Pacificador. Imagine que por um dia apenas, o Estado Brasileiro pudesse ser personificado e, assim como qualquer mortal, responder em juízo por quase todos os crimes categorizados pelo Poder Judiciário ao longo dos séculos. A Praça do Pacificador, em Duque de Caxias foi palco, na última terça-feira, 11 de setembro, de um evento inovador que tentou abarcar tal realidade. Um tribunal popular foi montado para a condenação simbólica de uma entidade que afeta a vida de todos nós. Movimentos sociais como o Fórum Grita Baixada, Movimento Negro Unificado, Rede de Mães e Familiares Vítimas da Violência de Estado na Baixada Fluminense, Centro de Direitos Humanos da Diocese de Nova Iguaçu, Casa Fluminense, dentre outros, simularam um julgamento em que o Estado Brasileiro, na condição de réu, seria responsabilizado pelos seus crimes, especialmente os de genocídio contra a populaçã...

Reunião dos núcleos do FGB contou com apresentação de diagnósticos sociais e desafios de articulação nos territórios

22 de agosto de 2017  A primeira reunião dos núcleos que compõem o Fórum Grita Baixada foi marcada por grande interação entre o grupo. As dinâmicas, criadas pelo articulador do FGB, Douglas Almeida, incluíram uma mística de autoconhecimento, um diagnóstico sobre os problemas de cada região, além dos desafios de articulação que precisam ser postos em prática. Antes, a coordenadora do Projeto de Litigância Estratégica, Bárbara Lucas, foi convidada pelo coordenador do Fórum, Adriano de Araujo, a fazer uma breve explicação sobre o projeto que irá ser apresentado essa semana. Ela aproveitou o ensejo e convidou os representantes dos núcleos a chamarem moradores de suas localidades em igual situação.  “É um procedimento em que será feita uma responsabilização dos agentes do Estado, além de fortalecer a Rede de Mães Vítimas da Violência da Baixada através de um acompanhamento visando a reparação psíquica pelas perdas brutais que elas tiveram. Temos um grupo de...

Caminhos para a Superação da Violência

Organizada pela Diocese de Nova Iguaçu, em parceria com o Fórum Grita Baixada, audiência pública na Câmara Municipal da cidade acolhe propostas de políticas públicas de instituições, movimentos sociais e cidadãos.  Na última quinta-feira (10/05), a Diocese de Nova Iguaçu realizou, na Câmara Municipal da cidade, a audiência pública “Caminhos para a Superação da Violência”. Inspirada pela Campanha da Fraternidade 2018, buscou-se atender a uma das sugestões da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) que é a de que Dioceses e organizações da sociedade civil promovam encontros para a busca de iniciativas que possam contribuir para a superação da violência. O Bispo Diocesano Dom Luciano Bergamin abriu a audiência explicando os objetivos do encontro e a relação com a campanha da fraternidade de 2018. Também participaram do encontro o vice-prefeito de Nova Iguaçu, Carlos Ferreira, os vereadores Carlos Chambarelli, que acolheu a audiência pública e Fernand...